quarta-feira, 26 de junho de 2019

Uma história mal contada e um toureiro de valor que está a ser injustiçado

Só ninguém entende porque razão, se a Junta de Freguesia de Abiul queria tanto
o cavalo "Campo Pequeno" na sua praça, foi contratar Salgueiro para substituir
David Gomes e não contratou Moura Caetano, que é agora o proprietário do
famoso craque...


O cavaleiro David Gomes perdeu, para já, duas corridas, uma em Abiul e outra em Alter, mais por se ter separado do apoderado Pedro Penedo do que propriamente por ter vendido o seu cavalo craque “Campo Pequeno”. Está a ser vítima de uma injustiça. É preciso dizê-lo

Miguel Alvarenga - O apoderado Pedro Penedo foi o último a saber, como na história do marido enganado, que o “seu” toureiro David Gomes, afinal, sempre vendera o cavalo craque “Campo Pequeno” a João Moura Caetano - e esse foi, afinal, o grande cerne da questão que está a dar tanto que falar no nosso meio taurino.
Desconfortável com o facto de o toureiro não lhe ter dado cavaco - aí, David, esteve mal - sobre um assunto que tinha (e teve), obviamente, a ver com a sua carreira, o apoderado apressou-se a telefonar à Junta de Freguesia de Abiul a dar conta de que o cavaleiro se desfizera do cavalo. Penedo dera a sua palavra, como a Junta desejava, que David se apresentaria a 14 de Agosto em Abiul com o “Campo Pequeno”.
Pelos vistos, a Junta de Freguesia de Abiul contrata cavalos - e não toureiros. Queria na sua praça o “Campo Pequeno”. David Gomes era, pelo que parece, uma presença indiferente, o importante era o cavalo. É o que se conclui do comunicado que a Junta depois emitiu a tentar explicar os motivos da “descontratação” do cavaleiro.
Disse a Junta - e isso quase atinge as raias do ridículo - que teve uma trabalhão dos diabos a convencer os aficionados de Abiul das razões por que contratou David Gomes para a Feira Taurina de Agosto, assim como quem diz “é um cavaleiro desconhecido que não vale nada, mas que tem um cavalo muito bom e por isso o vamos trazer à nossa praça”.
Não estou a ver o senhor presidente da Junta a andar pela vila a bater às portas e a dizer às pessoas:
- Bom dia, minha senhora, venho aqui explicar que este ano contratámos o cavaleiro David Gomes…
- Quem?…
- O David Gomes. É um toureiro novo, pouco conhecido, tomou a alternativa no ano passado, mas tem um cavalo fantástico e vai dar um show aqui na nossa praça…
- Ah, está bem, senhor presidente! Então venha de lá o Gomes e o cavalo!
E a seguir, noutra porta:
- Bom dia, amigo Zé.
- Bom dia, senhor presidente, então o que manda vocelência?
- Vim só explicar-lhe que este ano vamos trazer à nossa praça o cavaleiro David Gomes…
- Não conheço… mas aqui não vinham só os conhecidos?
- Sim, este não é lá muito conhecido, mas tem um cavalo extraordinário de que todos vão gostar muito…
- Veja lá, senhor presidente, se é mesmo assim…
- É, amigo Zé, fique descansado que vai gostar…
E por aí adiante… Não acredito que isto se tenha passado, por mais que a Junta tente justificar agora que deu o dito por não dito na contratação de David Gomes, depois do trabalhão que teve a convencer todos os cidadãos de Abiul, um a um, de que valia a pena contratá-lo - só pelo facto de o toureiro se ter desfeito do cavalo.
E há aqui uma coisa que ninguém entende: se a Junta de Abiul queria tanto o cavalo “Campo Pequeno” a brilhar na sua praça, porque foi depois tentar contratar Bastinhas e porque acabou por contratar Salgueiro para substituir David? Não era muito mais lógico contratarem Moura Caetano, que é agora quem tem na sua quadra o cavalo “Campo Pequeno”?…
Em Abiul foi assim. Uma história mal contada. Em Alter do Chão foi diferente. E foi pior. David Gomes chegou a ser anunciado pelo empresário Américo Rolo, depois de ter sido suspensa por chuva a corrida de 25 de Abril, para a corrida de Agosto, onde iria actuar com Manuel Telles Bastos e Miguel Moura. E aqui não saiu por causa do cavalo. Aqui saiu porque Pedro Penedo também está envolvido na organização da corrida e o deixou de apoderar. Se já não o apodera, já não faz sentido que o leve a essa corrida…
Em causa, no meio disto tudo, fica o valor de David Gomes como toureiro. E não pode ficar. O cavaleiro da Malveira, exímio equitador, toureiro que tem feito uma trajectória digna, merecia maior respeito.
Mas esta história não é nova e muito menos inédita. Tem acontecido variadas vezes e com inúmeros toureiros.
David Gomes veio agora dizer que se separou de Pedro Penedo por não se sentir devidamente defendido pelo apoderado e ter perdido a confiança nele.
Pedro Penedo, por seu turno, explicou que é um homem de palavra - e é, ninguém tem dúvidas - e que fizera o contrato com a Junta de Abiul com a garantia de que o toureiro levava o cavalo “Campo Pequeno”.
O único erro nesta história foi o facto de David vender o cavalo e não dar conta disso ao apoderado. Podia vender o que quisesse, a vida é sua e ninguém tem nada a ver com isso. Mas vender aquele que era o seu cavalo craque era uma coisa que poderia ter - e teve - reflexos na sua carreira e era, portanto, um caso que tinha a ver com o apoderado e com a união profissional que os mantinha lado a lado. Não é o mesmo que vender um automóvel ou outra coisa qualquer que não tivesse influência alguma na sua profissão de cavaleiro tauromáquico - que Penedo dirigia como apoderado.
O mal nisto tudo não foi especialmente o facto de ter vendido o cavalo. Foi, acima de tudo, o facto de Pedro Penedo se ter sentido o “marido enganado” e ter sido o último a saber.
Esse foi o erro de David. Já lhe custou duas boas corridas. Oxalá o preço a pagar não seja ainda mais alto.

Fotos D.R. e Mónica Mendes