domingo, 23 de junho de 2019

Alcochete: nasceu uma estrela e brilharam outras duas!

António Prates, visivelmente emocionado, beijado por seu pai no momento em
que este lhe concedeu a alternativa. Em baixo, um grande ferro no último toiro
da noite, onde "explodiu" e triunfou, depois de no toiro do doutoramento ter
andado mais nervoso e mais "acelerado", acusando o peso normal  e a pressão
da noite que estava a viver


Prates "explodiu" ontem no último toiro, depois de no da alternativa ter acusado o peso e a pressão da noite que estava a viver. Nasceu uma estrela e brilharam outras duas: Telles voltou ontem a ter 20 anos e deu uma lição de cátedra no quarto toiro. Palha reafirmou o seu valor e a ousadia da sua arte com que devolveu à Festa a emoção e o risco. Nas pegas, ganhou o Grupo de Alcochete. Os Charruas não foram toiros fáceis, nem bravos. Mas "tinham teclas" e deram que fazer aos toureiros. A praça encheu, foi uma noite em grande

Miguel Alvarenga - Praça à cunha (três quartos fortes, cheia à vista) ontem à noite em Alcochete na corrida de alternativa de António Prates (fotos). Toiros de Charrua a puxar para o mansote, pesados (quatro acima dos 600 quilos!), compridos, "com teclas" e seriedade, nobres na generalidade, daqueles que "dão trabalho aos toureiros". difíceis de se fixar, andarilhos mas "brutos". Pode não ter havido grande bravura, mas emoção houve.
Grande ambiente, muitas caras conhecidas nas bancadas, as honrosas presenças dos antigos cavaleiros D. Francisco de Mascarenhas e Gerald Pellén, de Diego Ventura e outros mais. Era uma corrida fora de data tradicional em Alcochete, mas a promoção foi excelente e o nascimento de uma confirmada estrela do toureio a cavalo levou público à praça, apesar de à mesma hora se realizar outra grande corrrida no Cartaxo (praça muito composta. também) e de à tarde ter decorrido em Badajoz a (também) alternativa de "Juanito".
António Prates recebeu a alternativa, num momento de grande emoção, concedida por seu pai, o antigo cavaleiro José Prates (trajado à civil), com o testemunho de António Ribeiro Telles e Francisco Palha.
No toiro do doutoramento, lide brindada à sua família (pais e irmãos), António acusou o peso e a pressão da responsabilidade e do significado que uma noite destas tem obrigatoriamente para qualquer toureiro. Andou demasiado "apressado", sem contudo deixar de vincar, em ferros e pormenores de brega relevantes, todo o seu querer, a sua vontade e a atitude com que se vem afirmando nas últimas temporadas. Sofreu alguns toques, uma colhida que por sorte não resultou em queda, mas o público esteve com ele e foram mais as coisas boas que as más. Pode não ter sido, e não foi, a actuação sonhada para a noite da alternativa, mas no final deu volta e o público esteve carinhoso com ele.
No último toiro da corrida, igual aos outros, andarilho, a empregar-se pouco e dar "murros" com violência no momento da reunião, a música já foi outra e António Prates, mais tranquilo, realizou então uma lide muito mais consistente e sólida, com ferros de muita emoção, brega e lide a primor, terminando com dois "quiebros" cravados num palmo de terreno com o cavalo "DNA" (Coudelaria Lima Duarte) que criaram verdadeiro alvoroço nas bancadas. Saíu em beleza, com o dever cumprido e o sonho realizado. O toureio a cavalo tem uma nova estrela e de Alcochete o jovem cavaleiro parte para Évora, onde no próximo sábado vai enfrentar os toiros de Murteira Grave "em guerra" com João Moura Jr. e Francisco Palha.
Esta segunda lide de Prates foi por ele dedicada aos céus, à memória do apoderado e empresário "Nené" e a seus dois filhos António José e Margarida - de lágrimas nos olhos.
António Ribeiro Telles, que estivera apenas regular na lide do complicado segundo toiro da noite, bem mas sem atingir o fulgor a que estamos habituados, deu uma autêntica lição de cátedra no quarto, parecia ele que não passaram já 36 anos sobre a sua alternativa e que estava outra vez nos princípios e com as ganas que os novos têm de mostrar quanto valem e de se afirmarem neste mundo que não é fácil.
António toureia e manda. Quando está em praça, é tudo dele. E ontem foi. Uma lide de "explosão" e maestria, que empolgou, galvanizou e até arrepiou pela perfeição, pela arte, pelo bom gosto e pela verdade e emoção com que ele toureou um toiro que também não era fácil. Mais palavras para quê?
A Francisco Palha devemos, nas últimas temporadas, o facto de ter posto os pontos nos iis e de ter devolvido à Festa a emoção e o risco que daqui andavam arredados. Ele agigantou-se neste meio, fez-se herói, pisou a linha de fogo como há muito ninguém ousava pisar, apertou com todos e acordou-os do marasmo em que isto estava. E os resultados estão à vista. Acabou o (falso) esplendor dos toiros "nhoc-nhoc", o público voltou a exigir os toiros de verdade e as ganadarias duras e, mais importante, talvez, os cavaleiros ganharam com o "factor Palha" um novo fulgor e parece mesmo que uma nova vontade de triunfo e de não ficaram "por baixo" dele.
Ontem, com dois toiros que também não foram fáceis (nenhum foi), Palhinha voltou a agigantar-se, pôs a carne no assador, disse outra vez "estou aqui!" - e esteve. Duas lides deslumbrantes, em que pontificaram a verdade, o risco, a ousadia e a emoção, o bom toureio, a confiança e a solidez que transmite nos rasgos de valentia e arte que são os grandes pilares de qualquer actuação sua. Esteve enorme!
No que às pegas diz respeito, os toiros não fizeram mal, meteram sempre bem a cabeça aos forcados, foram nobres e a noite ontem foi dos Amadores de Alcochete. Uma primeira pega monumental de Manuel Pinto que foi um autêntico hino de glória e de emoção à arte de pegar toiros, outra brilhante de Manuel Teixeira Duarte e a última, imponente, de António José Cardoso. Grupo a ajudar em grande, três pegas à primeira. João Rei e Diogo Van den Toor estiveram, como sempre, poderosos (íssimos) nas ajudas. Francisco Palha brindou aos dois a sua segunda lide e com toda a justiça chamou-lhes "os dois primeiros ajudas do mundo".
Menos brilhante, mas sem deixar de ser valorosa e genuína, foi ontem a intervenção dos Amadores de Coruche, que não pegavam nesta praça há dez anos. Tiago Gonçalves pegou o primeiro toiro da noite à segunda tentativa, António Tomás concretizou também à segunda a pega do terceiro toiro da ordem e o cabo José Macedo Tomás pegou o quinto à primeira, recusando depois dar a autorizada volta à arena por, segundo me explicou, "não ter sido uma pega brilhante, não ter tido a emoção que se desejava e, sobretudo, por considerar que a prestação do grupo não foi, no geral, a que desejávamos". Neste quinto toiro, destacou-se a rabejar João Ferreira Prates, um dos pilares deste grupo.
O labor dos peões de brega, ontem, centrou-se sobretudo na colocação dos toiros para os forcados, que não foi tarefa fácil pela eterna nega que eles davam em fixar-se, correndo soltos de lado em lado e complicando. Esforçados, cheios de trabalho, andaram João Ribeiro "Curro", António Telles Bastos, Diogo Malafaia, Jorge Alegrias, Nuno Oliveira, Pedro Noronha e João Viegas. Pela arte, o destaque vai para Telles Bastos.
Lara Gregório de Oliveira esteve brilhante na direcção da corrida, concedendo música com rigor e apenas e só quando considerou que era merecido mandar tocar a Banda de Alcochete. Todos tiveram música nas suas lides, mas a banda só entrou em acção no momento certo. A nova directora esteve ontem assessorada pelo competente médico veterinário Dr. Jorge Moreira da Silva.
À corrida presidiu o presidente da Câmara de Alcochete, Fernando Pina Pinto, a quem o Grupo de Alcochete brindou a sua segunda pega.
Para o jovem António Prates, o sonho ficou ontem comprido. Ele foi, nos últimos anos, o cavaleiro praticante que mais apontou e que mais se destacou e esta noite reafirmou o que dele se esperava: é um sério e sólido candidato a figura num futuro muito próximo. E ontem integrou-se indiscutivelmente no pelotão da frente.

Mais logo não perca todas as fotos; as pegas, uma a uma, os Momentos de Glória e os Famosos - pelas objectivas de Miguel Alvarenga, Mónica Mendes e Fernando Clemente.

Fotos M. Alvarenga