segunda-feira, 1 de junho de 2020

Vergonha de ser aficionado


Miguel Alvarenga - Começo sinceramente a ter vergonha de ser aficionado e de continuar, como D. Quixote, a lutar contra Moinhos que os que deviam lutar, e se dizem representantes dos taurinos e dos aficionados, não lutam. Antes cruzam os braços, pedem "dízimas" aos artistas e aos ganadeiros e nunca apresentam contas nem dizem para onde vai o dinheiro que lhes dão "de mão beijada" e com "ameaças" de que ficam vetados se não contribuirem. Já enjoa, é tempo de dizer basta! Se não tenho razão, digam-me, sei reconhecer os meus erros e retratar-me. Eles não.
O Governo abriu tudo a partir de hoje, segunda-feira, tudo o que é Cultura. Menos as praças de toiros e as grutas, imaginem. E nós ficámos calados. Como se fossemos homens das cavernas.
Hoje, segunda-feira, vai realizar-se no Campo Pequeno um concerto, ou espectáculo, tanto faz, de um gracioso que, dizem-me, não conheço, nunca ouvi falar, está agora na moda. Esgotou em poucas horas e já anunciaram um outro espectáculo extra na terça. O Presidente Marcelo, a ministra da Cultura e muito provavelmente o primeiro-ministro, vão assistir.
Marcelo Rebelo de Sousa esteve na praça de toiros de Sobral de Monte Agraço (foto) quando andava em pré-campanha. E todos acreditaram que íamos ter um Presidente aficionado - como o foram tantos outros. O Almirante Américo Tomás ia várias vezes ao Campo Pequeno. Mário Soares e Jorge Sampaio também foram. António Costa chegou a ir quando era presidente da Câmara de Lisboa, quando condecorou José Luis Gomes, histórico forcado e antigo cabo dos Forcados Amadores de Lisboa.
Marcelo Rebelo de Sousa não se dignou a voltar aos toiros depois de ter sido eleito inquilino do Palácio de Belém. Nem quando a empresa do Campo Pequeno o convidou para estar presente na corrida comemorativa dos 125 anos da inauguração da praça, nem nas galas à antiga portuguesa transmitidas pela RTP, ou na noite em que se rendeu homenagem à memória de um artista que se chamou Joaquim Bastinhas, que elevou Portugal e a sua Cultura nos quatro cantos do mundo ao longo de quarenta anos.
Mas hoje o Presidente Marcelo - dizem os jornais - vai ao concerto do gracioso no Campo Pequeno. E nós, fazemos o quê? Nada.
A PróToiro convocou um protesto (já que manifestações, excepto as do 1º de Maio e do Avante, estão ainda proibidas), como os anti-taurinos costumam fazer, para a porta da praça, a exigir igualdade, a mostrar a sua revolta pela exclusão, pela descriminação? É que a diferença é esta: os anti-taurinos "têm-nos no sítio", os tomates, que eu não sou pessoa de meias palavras ou de indirectas e nós, aficionados, temos a mania que os temos, mas somos só sonhadores e convencidos, tristes e ofendidos. E constantemente ignorados.
E a Associação Nacional de Toureiros, convocou os seus sócios para irem esta noite ao Campo Pequeno mostrar a sua indignação (nem que fossem em grupos de dez à vez...) por terem sido comparados aos homens pré-históricos das grutas/cavernas, por terem sido esquecidos, ignorados, excluídos? Alguém fez alguma coisa?
Não. Continuamos impávidos e serenos, a mostrar que somos eternamente parvos, que calamos e consentimos, que quanto mais nos batem mais gostamos deles?
Depois admirem-se de não terem feito nada. Esperem pelo projecto-lei que aí vem e que vai obrigar ao uso do velcro nos toiros e depois chorem lágrimas de crocodilo e barafustem quando já não houver nada a fazer.
Vergonha. Tristeza. Afinal, temos a Festa que merecemos. E os "taurinos" a que temos direito. E assim, repito, podem ter a certeza de que não vamos longe. E de que isto acaba em menos de nada.

Foto Maria Mil-Homens