"A grande besa do toureio a cavalo é a equitação" |
"Hoje só o Pablo e o Ventura é que enchem praças e ganham dinheiro. O toureio precisa de emoção, o toureio é uma arte de emoção e de risco" |
"Há uma longa e dura caminhada, uma aprendizagem, para se ser toureiro! As coisas não acontecem nunca de repente..." |
A alternativa no ano passado em Almeirim, concedida por seu pai, João Salgueiro |
João Salgueiro da Costa é o quinto cavaleiro de uma dinastia histórica iniciada por seu trisavô Carlos Pinto da Costa, que foi cavaleiro amador e depois prosseguida pelos cavaleiros de alternativa Dr. Fernando Salgueiro (bisavô), Fernando de Andrade Salgueiro (avô) e João Salgueiro (pai), que no ano passado lhe concedeu a alternativa na Monumental de Almeirim. No segundo ano como cavaleiro profissional e depois de ter sido durante quase dez anos “esperado” como um D. Sebastião, nunca chegando a dar “o salto” por que todos esperavam, o jovem João, Salgueirinho para os amigos, está hoje mais maduro, mais moralizado e finalmente bem montado para poder, por fim, marcar a diferença. Tem um novo apoderado, que é também um renovado incentivo, o conhecido José Manuel Ferreira Paulo “Cachapim” e ambos defendem que o toureiro “não quer ser apenas mais um”. “Hoje em dia, só o Pablo e o Ventura enchem praças e ganham dinheiro… o toureio precisa de emoção outra vez. E se eles andaram vários anos a marcar passo até chegarem onde chegaram, o meu momento pode chegar de repente também”, afirma, convicto de que “as coisas podem modificar-se de um momento para o outro”. João Salgueiro da Costa protagonizou no ano passado uma temporada de mudança e a de 2017 vai ser de afirmação, asegura. Sabe o que quer e sabe para onde vai. É um jovem de convicções fortes.
Entrevista de Miguel Alvarenga
- Andamos há quase dez anos à espera do novo Salgueiro… vai ser desta, João?
- Reconheço que houve altos e baixos na minha trajectória como cavaleiro praticante e que nem sempre correspondi ao que de mim se esperava. Houve muitos factores que condicionaram e justificaram essa espera. No ano passado tomei a alternativa e embora reconheça também que em algumas actuações não estive redondo, não atingi o patamar que pretendo alcançar, creio que a crítica e o público já me viram com outros olhos. A temporada de 2017, que vou iniciar, se o tempo o permitir, no próximo sábado no Festival da Granja, vai ser uma temporada decisiva para mim…
- … tipo ou vai ou racha?
- Mais ou menos isso. Estou preparado, estou moralizado, tenho dois novos cavalos muito bons e preparei-me muito durante o Inverno. Penso, sinceramente, que este pode ser finalmente o meu ano.
- O que é que não funcionou até aqui?
- Ser toureiro e ser toureiro a cavalo, sobretudo, implica e obriga a uma longa e dura caminhada. A base principal é a equitação. E depois há um caminho longo a percorrer, uma aprendizagem, uma rodagem, nada acontece de repente. Hoje em dia os miúdos começam e a crítica diz logo que nasceu uma estrela… Não há ninguém que não goste de receber elogios, os miúdos abem os computadores, lêem o que escreveram deles e convencem-se que já são os melhores. Nada se pode começar por cima, é sempre por baixo. E o maior exemplo disso penso que sou eu. Tive uma grande actuação na minha estreia em público no Campo Pequeno e depois… vim por aí abaixo…
- Hoje sentes-te finalmente preparado, é isso?
- Sim, não estava minimamente preparado quando comecei, é natural que assim fosse, mas esse triunfo entusiasmou-me e imaginei que daí para a frente iam ser todos assim… e a verdade é que não foram. Hoje sinto-me por fim preparado, bem montado, moralizado e capaz de fazer a diferença. E digo isso sem desprimor para nenhum companheiro. Há hoje muito bons cavaleiros. Não vou dizer nomes, obviamente, mas há outros que já todos vimos que não vão nunca chegar a lado nenhum e insistem em cá andar…
- É complicado, também, ser filho do João Salgueiro, o último cavaleiro que apareceu e rompeu de repente, chegando muito depressa aos primeiros lugares…
- Eu era miúdo e lembro-me muito bem dos grandes triunfos do meu pai e do grande momento que ele teve, sobretudo com os cavalos “Isco” e “Herói”. Foi, talvez nos últimos trinta anos e depois de João Moura, aquele que apareceu de repente e mais depressa conseguiu subir a escadaria da fama e da glória. E claro que não é fácil para mim quando as pessoas fazem comparações…
- Achas que os filhos que hoje toureiam ainda não conseguiram chegar aos calcanhares dos pais?
- Não gostava, nem me ficava bem, opinar sobre isso. Há, repito, cavaleiros muito bons, mas talvez não ajude o facto de, em alguns casos, os pais ainda cá andarem e ainda serem o que são. Não é nada fácil em qualquer actividade ser o sucessor de alguém que foi muito bom e que ainda é bom… Eu estou plenamente consciente das dificuldades que existem hoje, do panorama meio morno em que está o toureio a cavalo e da necessidade urgente que existe de voltar a haver emoção. O toureio foi sempre uma arte de emoção e de risco e o público às vezes adormece pela falta dessa emoção e desse risco. É preciso criar suspiros nas bancadas, levar as pessoas a levantarem-se em explosões de aplausos. O bonito disto é conseguirmos pôr cinco mil pessoas de pé a aplaudirem-nos! E isso nem sempre acontece…
- E depois, também faltam ídolos. Concordas, João? Hoje em dia, só o Pablo e o Ventura enchem praças…
- Essa é a verdade. Eles é que enchem praças e eles é que ganham dinheiro. É preciso mais. É preciso que surjam cavaleiros portugueses a fazer o mesmo. Como acontecia antigamente… Mas tanto o Pablo como o Ventura levaram alguns anos a serem o que são, lutaram muito, caminharam por uma trajectória de dificuldades dando a cara todos os dias até triunfarem. Há sempre um momento em que chega o nosso momento. E eu estou convicto de que já estive mais longe disso…
- Já tens assegurada a presença em praças e corridas importantes esta temporada?
- O meu apoderado está a delinear cuidadosamente a temporada. Vamos começar no sábado na Granja, depois devo tourear mais dois festivais e em Maio estarei em Coruche. Penso que há já outras corridas agendadas e que esta pode ser a temporada da minha definitiva afirmação.
- Falaste em cavalos novos, quais são?
- Tenho dois cavalos novos em que deposito grandes esperanças. O “Gallo II”, que tem ferro de Arsénio Cordeiro, seis anos e é um Lusitano puro. E a égua “Princesa”, com o ferro Salgueiro, uma Luso-Árabe. E mantenho os cavalos em que já tenho toureado, o “Mon Chéri”, o “Chacal”, o ”Chinoca” e o “Raposo”. Penso que tenho finalmente a quadra ideal e com que sonhava para poder dar aquele salto definitivo que tardava. Podem contar comigo!
Fotos Emílio de Jesus e D.R.