quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Morreu "Chaubet", um "forcado que deixou rasto"

Um dos mais emblemáticos livros que escreveu sobre
a Lisboa boémia de outras eras
Fotografado por mim no Campo Pequeno, quando
lhe fiz a última entrevista para o "Farpas", já há
uns anos - sobre o Monumento ao Forcado por que
se bateu durante mais de vinte anos
Assistindo a uma corrida de toiros
"Chaubet" com outro grande forcado e seu amigo, Simão Comenda
Comigo, na "Solmar", num almoço da Real Tertúlia D. Miguel I
Forcado completo, aqui a rabejar numa cernelha. Em baixo, o último dos muitos
livros que escreveu sobre Forcados, "À Unha!..."


"Chaubet", um dos grandes forcados da nossa História, autor de vários livros sobre a arte que tanto amava, morreu hoje com 92 anos e sem ter conseguido realizar o sonho de erguer no Campo Pequeno um Monumento ao Forcado

Miguel Alvarenga - Carlos Alberto Neves Anapaz Patrício Álvares, assim se chamava, que todos no meio taurino conheciam por "Chaubet", foi durante muitos anos controlador aéreo, estava aposentado da aeronáutica na Direcção-Geral da Aeronáutica Civil, mas foi nas arenas e no mundo da forcadagem que fez história e que se tornou célebre.
"Que me perdoem os que não estejam de acordo comigo, mas as minhas preferências vão para o 'Chaubet', que foi um forcado que deixou rasto, que foi pilar fundamental do Grupo (de Lisboa), assisti a enormes pegas desse fenómeno. Sempre decidido, dava sempre a cara e vi-o resolver problemas bem difíceis. Penso que ele tem direito a ser colocado ao lado dos grandes forcados que houve. Deixou testemunhos grandiosos no historial da modalidade" - escreveu um dia, do alto da sua sapiência indiscutível, o grande José Telo Barradas. E com isto, disse tudo.
"Chaubet" integrou nos anos 40 a formação que fundou o afamado Grupo de Forcados Amadores de Lisboa, sob a liderança do inesquecível Nuno Salvação Barreto - por quem ele tinha um carinho e uma admiração desmedidas.
Foi um forcado completo, pegou durante cerca de três décadas. Ex-aluno do Colégio Valsassina, escola de vida de que sempre se gabava de ter pertencido, foi também um atleta de referência no mundo do boxe, da ginástica, do futebol.
Viveu como poucos a Lisboa boémia de outras eras, as cenas de pancadaria que acabavam sempre e inevitavelmente ao balcão de uma taberna qualquer, a beberem copos uns com os outros. já amigos e depois da bebedeira. E escreveu muitos livros. Retratou essa Lisboa sobretudo em "Lisboa de Outras Eras - Vida Vivida", mas deu à estampa também outros livros dedicados sobretudo aos Forcados, que era a raça que ele amava, destacando-se "À Unha", o último que escreveu.
Foi crítico tauromáquico, publicou centenas de artigos em jornais, revistas e últimamente na internet. O tema era invariavelmente e sempre o mesmo: essa gente-outra que pega toiros, tema de que era conhecedor imenso.
Era uma peça única, tinha o seu feitio, muito especial. Depressa se incompatibilizava com este ou com aquele, como nos últimos anos de vida aconteceu com alguns elementos do seu Grupo de Amadores de Lisboa - mas uma coisa era certa, o "Chaubet" não tinha mau íntimo. Era embirrento, apenas e só. E só às vezes.
Implicava com a Associação de Forcados, que no seu tempo não havia coisas dessas e tudo corria bem na mesma, e criticou-a várias vezes em escritos que deram polémica. Mas sempre com sobriedade, com educação e com algum glamour, mesmo.
Tiva a sorte - que foi uma honra - de o ter conhecido bem e de com ele ter privado - e aprendido tanto, graças à relação de amizade que o unia desde miúdo ao meu tio Carlos e ao Dr. Frederico, por terem andado juntos no Valsassina.
Viveu os últimos vinte anos, mais se calhar, da sua vida, iludido com a vontade de erguer em frente à praça de toiros do Campo Pequeno um Monumento ao Forcado. Morreu sem realizar o seu sonho.
Que em paz descanse.

Carlos Alberto Patrício Álvares "Chaubet" morreu hoje com 92 anos. Não haverá velório. As cerimónias fúnebres decorrem amanhã, sexta-feira, às 14 horas, no cemitério dos Olivais, em Lisboa, onde será cremado. A sua Mulher e a sua filha endereçamos os mais sentidos pêsames.

Fotos D.R.