sexta-feira, 22 de junho de 2018

Campo Pequeno: toiros de êxito de Veiga Teixeira na noite de oportunidade aos "filhos de um deus menor"

Triunfo ganadeiro de Veiga Teixeira ontem em Lisboa: António Francisco da Veiga
Teixeira deu merecida e aplaudida volta à arena, justamente concedida pelo
director de corrida Manuel Gama, no último toiro da corrida, com a cavaleira
Verónica Cabaço, o forcado Fábio Beijinho e o primeiro ajuda do Grupo do
Cartaxo, autores da melhor pega da corrida
Gonçalo Fernandes confirmou a alternativa ontem no Campo Pequeno
Digníssima e notável confirmação de alternativa de Gonçalo Fernandes. Fez
tudo bem feito, sem falhas a apontar, agarrando com força esta merecida
oportunidade que lhe deu o Campo Pequeno
Marco José, veterano com 26 anos de alternativa, mostrou ontem ambição
renovada e teve uma lide em crescendo frente a um toiro inicialmente reservado
mas que foi colaborando e crescendo ao castigo
Boa actuação de Gilberto Filipe, excelente equitador e um bom intérprete, sempre,
da arte de tourear a cavalo
Foto Maria Mil-Homens
Marcelo Mendes foi o maior triunfador da noite de ontem
e merece ser repetido ainda este ano em Lisboa!
Parreirita Cigano bem quis, mas ontem as coisas sairam-lhe ao contrário...
Verónica Cabaço demonstrou muito valor e imenso querer. Se estivesse mais
bem apetrechada de cavalos, era um caso sério!
A primeira pega da noite, à segunda, esteve a cargo de Ricardo Matos, dos
Amadores de Coimbra
Pedro Silva fez a segunda pega dos Amadores de Coimbra (quarto toiro) à terceira
A primeira pega do Grupo de Monsaraz (segundo toiro) esteve a cargo de
Carlos Polme e foi consumada à terceira
A segunda pega dos Amadores de Monsaraz (quinto toiro) foi aquilo a que se
pode chamar uma carga de trabalhos. Executou-a André Mendes, quase sempre
mal ajudado pelos companheiros
Os Amadores do Cartaxo marcaram ontem claramente e de modo triunfal a
diferença. Duas pegas à primeira pelo cabo Bernardo Campino (foto de cima)
e por Fábio Beijinho (em baixo), que executou a melhor e mais emotiva pega
da corrida, recuando muito bem e fechando-se com decisão, com o grupo
a ajudar coeso


"Filhos de um deus menor", mas nem por isso inferiores aos consagrados, seis cavaleiros da "segunda divisão" tiveram ontem em Lisboa a oportunidade que justificaram merecer. Marcelo Mendes foi o grande triunfador e o que melhores unhas mostrou ter para tocar guitarra e Gonçalo Fernandes confirmou com muita dignidade a sua alternativa. Os Forcados do Cartaxo marcaram a diferença e a ganadaria Veiga Teixeira teve um importante triunfo com seis toiros sérios, com trapio, exigentes e a pedir contas. Corridas destas, sem "mais do mesmo", fazem falta para nos dar lufadas de ar puro. E mostrar que há outros toureiros que também merecem estar - e repetir - no Campo Pequeno.

Miguel Alvarenga - Dar uma oportunidade a toureiros menos vistos, alguns deles já com muitos anos de alternativa mas que, por esta ou aquela razão, nunca saltaram para a ribalta e continuam eternamente na "segunda divisão", constituiu ontem no Campo Pequeno aquilo que verdadeiramente se pode chamar uma lufada de ar puro. Mesmo tendo sido uma corrida fora de abono, foi um espectáculo agradável, com ritmo e, mais importante que tudo, com triunfos assinaláveis, sobretudo os de Marcelo Mendes e de Gonçalo Fernandes, que mesmo que possam não ter servido de nada para os toureiros (oxalá sirvam), nos proporcionaram uma noite agradável, pelo menos diferente e a fugir à costumeira pasmaceira do “mais do mesmo”.
Houve cavaleiros que recusaram entrar neste cartel por o considerarem "fraquito" e houve aficionados que ficaram em casa e não sentiram interesse em ver esta corrida. Não sabem, uns e outros, o que perderam. Valeu a pena assistir. Foi diferente. Não foi "mais do mesmo". E houve triunfos notáveis.
Aplaudo a iniciativa da empresa e sugiro até que a mesma se torne um hábito em todas as temporadas. Lá por serem “filhos de um deus menor” e não terem às costas um apelido solene e de tradição, os seis cavaleiros que ontem actuaram em Lisboa corresponderam, na generalidade, aos quinze minutos de fama que lhes foram proporcionados. E provaram que têm direito a pisar o mais importante palco da tauromaquia portuguesa. Marcelo e Gonçalo, pelo menos estes dois, merecem ser repetidos.
A oportunidade que lhes foi dada tinha consistência e fazia sentido, tinha peso e tinha justificação plena  já que estavam em jogo seis toiros de uma das mais sérias e mais duras ganadarias nacionais, a de Veiga Teixeira.
Para se ser alguém, é preciso sê-lo a sério, com verdade e sem meias tintas. Se os toureiros ambicionam vingar e dar um passo em frente, é importante e é exigível que o façam diante de toiros de verdade. Como escrevi ao longo da semana, quem tem unhas é que toca guitarra. E ontem todos eles tocaram, uns com mais, outros com menos unhas. Mas todos tocaram.

Digna confirmação 
de Gonçalo Fernandes

As melodias foram distintas e as mais aplaudidas foram as de Gonçalo Fernandes, que abriu praça depois de confirmar a alternativa; e de Marcelo Mendes, que apesar de ser um cavaleiro que actua pouco, deixou ontem bem claro que continua a sonhar alto e que não anda cá só para ser mais um.
Os toiros de Veiga Teixeira, exigentes e a pedir contas, como é norma da ganadaria, trouxeram emoção e muita seriedade à corrida e justificou-se plenamente a volta que o director Manuel Gama concedeu ao ganadeiro António Francisco da Veiga Teixeira no sexto toiro da noite. Foi uma corrida dura e exigente, muito homogénea e de aplaudida apresentação.
Gonçalo Fernandes, cavaleiro de Seia, filho do também antigo cavaleiro de alternativa Zeca Fernandes, vinha pela primeira vez a Lisboa para confirmar a sua alternativa.
Surpreendeu pela positiva. Destacou-se pelo querer e pela atitude com que manifestou logo de início qaue estava ali para ser digno merecedor desta oportunidade, esperando o toiro à porta da gaiola e brilhando logo nos compridos com um segundo muito bom e esteve depois apurado nos curtos e na brega, cravando en su sítio e dando emoção às sortes, sem uma falha, sem nada a apontar. Uma lide limpa e digna a revelar um cavaleiro com valor, frente a um toiro exigente e que em momento algum “assustou” ou fez vacilar o cavaleiro.
Marco José, cavaleiro “veterano”, já com vinte e seis anos de alternativa (recebida em Lisboa, numa Corrida TV, das mãos de Paulo Caetano), apresentou-se no Campo Pequeno com renovada ambição. Algo reservado de inicío, o toiro cresceu ao castigo e embora nem sempre o tenha entendido na perfeição, o cavaleiro desenhou uma lide também em ritmo crescente e com ferros de boa marca, em nada defraudando as expectativas dos aficionados que tinham curiosidade em o rever.
Destaque nesta lide do cavaleiro de Leiria para a eficiente brega do também veterano peão de brega Francisco Paulino. Discreto e oportuno.
Gilberto Filipe era, dos seis, aquele que vai tendo maior actividade e os seus créditos estão há muito firmados. Excelente equitador e bom intérprete da arte de tourear a cavalo, andou ontem desenvolto e com a regularidade habitual, numa lide que resultou em pleno pela brega e pela cravagem dos ferros, que foi muito acertada e emotiva.

"Primavera Marcelista"

Marcelo Mendes enfrentou um toiro bravo e pese embora a adversidade que constitui o facto de pouco tourear, agarrou ontem com unhas e dentes esta oportunidade que o Campo Pequeno lhe deu e foram seus os maiores momentos da noite numa lide empolgante e que galvanizou o público pela emoção que ele pôs em todas as sortes, pelos terrenos que pisou e pela seriedade que impôs no momento de cravar os ferros.
Esteve brilhante (íssimo!) na brega, nos remates, nos adornos e sobretudo na cravagem dos ferros, pisando terrenos de compromisso, arriscando, dando a cara como se ontem fosse o primeiro dia do resto da sua vida.
Já na recta final trouxe à praça o seu célebre cavalo “Único”, recordando os tempos em que foi grande promessa. Os anos passaram, Marcelo não deu ainda o salto que por certo ambiciona, mas o notável triunfo de ontem foi um importantíssimo e aclamado passo em frente na carreira de um jovem que continua a ter um futuro promissor e que viveu em Lisboa um êxito que obrigatoriamente lhe vai trazer um novo alento e uma esperança redobrada. Deu uma aplaudida volta à arena e veio depois ainda ao centro agradecer uma forte ovação, recusando com humildade a segunda volta - que todos pediam e que merecia ter dado.
Regressar ainda esta temporada ao Campo Pequeno é o prémio que merece - e que a empresa por certo não se vai esquecer de lhe dar. Ele viveu ontem nos minutos em que esteve na arena a brilhar, todo o esplendor de uma autêntica e esperançosa "Primavera Marcelista". Este toureiro merece mais!
O toiro de Parreirita Cigano, o quinto da noite, podia ser meio reservado de início, mas tinha investidas claras e foi nobre, quem ontem não esteve bem foi o cavaleiro. Permitiu toques no cavalo e apesar de tentar fazer o seu toureio ousado, atrevido e de risco, as coisas não resultaram na perfeição.
Insistiu nos “quiebros” mesmo depois de o cavalo lhe ter dado duas negas, andou meio à deriva e sem meio de se encontrar, foi dos seis o que andou mais apagado - quando era, no cartel, aquele em que muitos mais esperança depositavam.
Parreirita é um toureiro de valor, mas ontem deu um passo atrás em relação ao que dele se esperava e em relação, sobretudo, à embalagem positiva com que voltava a Lisboa depois de nesta praça ter triunfado nas duas últimas temporadas. Por morrer uma andorinha nunca acabou a Primavera...

Verónica: se um dia 
ela tiver uma boa quadra...

Verónica Cabaço, bonita e vistosa cavaleira praticante, é uma valentona, entra pelos toiros dentro, pisa terrenos apertados, tem noção e sentido profundo de lide e procura fazer tudo com verdade e seriedade. Com emoção.
Os ferros nem sempre resultaram acertados no momento de reunir, mas ficou a impressão de que se um dia tiver uma melhor quadra, possuir cavalos que lhe permitam o que estes não a deixam alcançar, será certamente uma toureira a ter em conta. Em grande conta mesmo - e raramente me engano…
Tem valor de sobra, quer mais e mais, foi isso mesmo que ontem nos disse.

Grupo do Cartaxo marcou a diferença

No campo da forcadagem, dava também a empresa oportunidade a três grupos de forcados da “segunda divisão” e para os quais não se adivinhava à partida tarefa muito fácil face ao confronto com os toiros de Veiga Teixeira.
Os Amadores do Cartaxo marcaram claramente a diferença e estiveram bem destacados dos seus companheiros de cartel. Duas pegas à primeira, com o grupo a ajudar bem. O terceiro toiro da noite foi pegado pelo cabo Bernardo Campino e o último por Fábio Beijinho, na melhor pega da corrida.
O Grupo de Coimbra teve na cara dos toiros Ricardo Matos (à segunda) e Pedro Silva (à terceira) e pelo de Monsaraz pegaram Carlos Polme (à terceira) e André Mendes (à terceira ou quarta, perdi-lhes a conta... acabaram por pegar o toiro todos ao molho e com fé em Deus), acusando estes dois grupos a dureza dos Veiga Teixeira, mas sobretudo a menor experiência, consequência da escassa actividade que têm. Ambos possuem bons forcados de cara, o mesmo não se podendo dizer em relação aos ajudas.
Ao início da corrida guardou-se um minuto de silêncio por vários elementos da Festa falecidos - mas convém não banalizar este acto, que já começa a ser demasiado em todas as corridas. Bem sei que, infelizmente, morre muita gente, mas não passem agora a fazer do minuto de silêncio uma rotina obrigatória em todas as corridas…
Manuel Gama esteve apertadíssimo na direcção da corrida, assessorado pelo médico veterinário Dr. Jorge Moreira da Silva e também por dois jovens candidatos a directores de corrida que ontem iniciaram o seu estágio supervisionados pelo Estado-Maior da IGAC.
As dificuldades impostas pelos toiros aos forcados arrastou a corrida, que já terminou perto da uma da manhã.
Feitas as contas, valeu a pena esta corrida, foi pelo menos diferente das outras em que já sabemos sempre de antemão o que vai acontecer, em que cavalos vão sair os toureiros, como vão lidar os toiros, etc. Ontem, tudo podia acontecer. E aconteceram, na realidade, coisas muito positivas.

Fotos Emílio de Jesus