sexta-feira, 26 de julho de 2019

Campo Pequeno: mandaram os Graves, impôs-se Rouxinol e o resto não teve história...

Luis Rouxinol Jr. marcou a diferença, impôs-se como toureiro da primeira fila
e ontem foi o triunfador maior de uma noite em que se esperava muito mais de
todos...
João Telles teve bons ferros e momentos emotivos, mas ontem esteve algo aquém
do que nos tem habituado...
Francisco Palha deu um ar, mais que isso, um "arzão" da sua graça, no quinto
toiro da corrida. Mas ontem ficou por aí...


Os Graves mandaram ontem na arena do Campo Pequeno. Rouxinol Jr. impôs-se como toureiro da primeira fila, Telles e Palha deram ares da suas graça, mas a corrida não teve o sucesso para que apontavam as expectativas. Não vou dizer que os toureiros e os forcados estiveram "por baixo" dos Graves, mas por cima também não os vimos estar...

Miguel Alvarenga - A sétima corrida da temporada do Campo Pequeno ficou, em termos artísticos, muito aquém das expectativas que rodeavam a presença de três "leões" do toureio a cavalo e de dois grande grupos de forcados na noite em que se comemorava na capital o 75º aniversário da fundação da histórica ganadaria Murteira Grave.
Menos rematado o primeiro, os seis toiros de Murteira Grave tiveram digna apresentação, mobilidade, nenhum veio para as tábuas, tinham "teclas", deram luta, impuseram seriedade, não grande transmissão, mas foram toiros exigentes e daqueles que por norma "descompõem" tudo e todos, muito dentro do tipo da afamada divisa da Galeana.
Apesar de algo aquém do êxito que conquistaram no São Pedro em Évora, os toiros de Joaquim Grave pautaram ontem pelo usual diapasão de verdade, de seriedade e de emoção que caracterizam esta ganadaria. Não transmitiram em demasia, mas tiveram a mobilidade necessária e pediram contas aos cavaleiros e aos forcados. Não são toiros para "brincadeiras". E ontem nem sempre foram toureados e pegados como se impunha.
Toureiros e forcados não estiveram propriamente "por baixo" dos toiros, como se costuma dizer, mas por cima ou, pelo menos, muito por cima, também não estiveram. Luis Rouxinol Jr. impôs-se uma vez mais como toureiro da primeira fila e como toureiro que não perde nem a feijões, sobretudo no terceiro toiro da noite, onde teve uma lide brilhante. João Ribeiro Telles e Francisco Palha tiveram actuações cheias de intermitências, onde o alto se aliou ao baixo, nenhum deles chegando a romper como se desejava, destacando-se mais Palhinha no quinto toiro. Os forcados de Santarém e de Coruche fizeram cada qual uma grande pega, precisamente as duas primeiras da noite, e o resto foi uma tarefa demasiado dura e com menos história do que se esperava - e se exigia.
O público correspondeu e a praça registou uma bonita entrada de três quartos. No camarote da PróToiro assistiram alguns deputados de vários quadrantes políticos. E pouco mais houve a registar de uma corrida que foi mais desilusão do que sucesso. Apesar de ser, desta primeira fase da temporada, aquela que se aguardava com maior expectativa. Mas às vezes o homem dispõe e depois o toiro descompõe. E chega mesmo a descompor tudo...
João Telles vive um momento grande - ninguém tem dúvidas disso e os êxitos recentes o comprovam. Mas ontem andou apenas "morno" no Campo Pequeno e uns furos abaixo do seu melhor. Nem sempre desenhou as sortes que os toiros exigiam, abusou das entradas ao piton contrário, falhou ferros e saíu algumas vezes em falso. Teve ferros bons e momentos com a marca da emoção do seu toureio de perfeição e grandeza. Mas ontem não foi o João Telles verdadeiro quem esteve no Campo Pequeno...
E Francisco Palha idem, idem, aspas, aspas. Não explodiu, como costuma explodir, em nenhuma das duas actuações. Os Graves pediram contas e ele nem sempre lhas deu. No segundo toiro da noite (que era o segundo do seu lote e que lidou por este primeiro ter um corno partido e ter sido recolhido) esteve apenas assim-assim e recusou, com dignidade, a volta à arena que o director autorizara. No quinto, o sobrero, esteve quase, quase mesmo, a alcançar um triunfo "à Palhinha". Mas teve alguns falhanços de ferros que acabaram por retirar brilho à lide. Houve, contudo, "ferrões" de extrema emoção, daqueles que páram os corações. Mas no contexto geral foi também uma lide com altos e baixos, sem o brio costumeiro que, espero, Francisco recupere esta noite em Salvaterra. E se reencontre.
Luis Rouxinol Jr. protagonizou a melhor actuação da noite no terceiro toiro da corrida, o primeiro do seu lote. Mandou recolher os bandarilheiros e pôs logo o público de pé com uma empolgante sorte de gaiola, prosseguindo depois numa lide em crescendo e em que se destacou a bregar, a lidar e a cravar e nos artísticos e emotivos remates das sortes. Esteve com redobrada atitude e a demonstrar que quer à viva força ser um dos cavaleiros da frente. No último toiro, talvez o mais complicado dos seis Graves, teve também uma lide de alto nível e que, mesmo sem o brilhantismo da primeira, nos permite a todos aclamá-lo como triunfador maior da noite de ontem em Lisboa.
Para os forcados, os toiros foram mesmo Graves e a noite não foi nada fácil para os Amadores de Santarém e os Amadores de Coruche, que não deixaram de elevar os seus pergaminhos de grandes grupos que são, mas sentiram as dificuldades impostas por toiros que não dão azo a deslizes de espécie alguma.
Houve uma grande pega de cada grupo, precisamente as duas primeiras. E mais nada. Lourenço Ribeiro, forcado consagrado do Grupo de Santarém, fez um pegão à primeira ao primeiro toiro da noite, com o grupo a ajudar muito bem e ele a impor a sua técnica, a sua raça e a sua arte; e José Macedo Tomás, cabo do Grupo de Coruche, puxou dos galões de grande forcado que é e pegou na sua primeira tentativa, com elevado brilhantismo, o segundo Grave da noite, a dobrar Miguel Raposo que se lesionou num ombro na primeira tentativa para efectuar a pega a este toiro.
Pelos Amadores de Santarém foram ainda caras Joaquim Grave, filho do antigo cabo Carlos Grave, um jovem que já se percebeu que vai ser um grande forcado, honrando a ilustre família que tanta história deu a este grupo, e que este ano se estreou no festival de Sobral de Monte Agraço e fez depois recentemente uma grande pega em Idanha-a-Nova. Ainda pouco experiente e pouco preparado para um desafio destes com Graves, o jovem Joaquim demonstrou pelo menos muita vontade e enorme raça, pegando à quarta tentativa; e o grande Francisco Graciosa, que pegou, mas nunca devia ter pegado, o quinto toiro da corrida. Finda a lide de Francisco Palha, o toiro teve uma investida brutal contra as tábuas e partiu um corno. Imediatamente deveria ter sido recolhido e a pega, paciência, ficava por executar. Sem que isso quisesse significar, minimamente, que o toiro tivesse ido "vivo" para dentro e sem que isso melindrasse ao de leve a honra e o prestígio do centenário Grupo de Santarém. São azares que acontecem e que podia ter acontecido, por exemplo, durante a lide de Palha, ficando este impossibilitado de a prosseguir, sem que daí viesse algum mal para a sua actuação e muito menos para a carreira do toureiro. Acontece algumas vezes.
O toiro lesionou-se, partiu um corno, azar, paciência, tinha que ir para dentro. O director de corrida Tiago Tavares e o médico veterinário Jorge Moreira da Silva mandaram-no recolher, mas depois cederam ao pedido do cabo João Grave (incompreensível) para que o toiro fosse pegado de cernelha - e não o foi. Não encabrestava de maneira alguma. Gerou-se a confusão na trincheira, elementos actuais e antigos tomaram posição junto à porta dos curros para evitar que os funcionários a abrissem e houve mesmo alguma exaltação na bancada, com destacados aficionados (com responsabilidades na Festa) a chegarem mesmo a vias de facto, motivando a intervenção de agentes policiais para acalmar os ânimos. O grupo voltou à arena - e não deveria nunca ter voltado - e Graciosa fez a pega. Que não devia nunca ter feito.
Não estava, não podia estar de modo algum, em causa, a honra do grupo. Por isso não a tinham que defender da forma que o fizeram. O toiro não ia "vivo" para dentro. Apenas e só não ia pegado por ter partido um corno. Lamente-se a falta de pulso da direcção da corrida - que desde o primeiro minuto tinha que ter recolhido o toiro lesionado. E lamente-se a atitude do Grupo de Santarém (que o próprio ganadero e antigo forcado Joaquim Grave reprovou depois no final em conversa particular comigo e que por isso não vou tornar pública, obviamente), um grupo histórico, centenário, glorioso e que não podia ter protagonizado uma cena destas. No final, quando atravessava a praça, o grupo foi vaiado pelo público. Também não era caso para isso. Mas houve uma clara reprovação dos aficionados de tudo o que infelizmente se passou.
Questionei ainda o antigo cabo Carlos Empis sobre se o toiro deveria ou não ter sido pegado e a sua resposta foi clara e bem elucidativa: "Claro que não. Partiu um corno, tinha que ser recolhido e mais nada".
E posto isto, refiro ainda que pelos Amadores de Coruche as duas outras pegas foram executadas por João Prates à quarta e por António Tomás à segunda. Pegas duras e pegas rijas.
Tirando a atitude lamentável de não ter imediatamente mandado para dentro o toiro lesionado, a direcção de corrida de Tiago Tavares foi correcta e diligente.
Resumindo e concluindo, a corrida foi muito menos do que se esperava. Saímos todos da praça menos contentes do que podíamos ter saído. E quando assim é, merda para isto!...

Fotos Maria Mil-Homens