Sol às moscas. Em tempo de calor, como o que estava ontem na Chamusca, as corridas têm que ser à noite. É necessário e urgente que os empresários repensem a Festa |
Um aficionado e uma aficionada que mereciam ontem ter recebido também um troféu. Não é qualquer um que está três horas à torreira do sol, a derreter com 40 graus, para ver uma tourada... |
Ao contrário do sol, os sectores de sombra estavam cheios |
Valor, arte, entrega, como se fosse sempre um principiante. Luis Rouxinol assinou ontem na Chamusca duas grandes actuações |
Filipe Gonçalves foi autor de duas lides de muito mérito, sobressaindo na última com os quiebros que entusiasmaram o público |
Um espectacular par de bandarilhas do enorme João Ferreira! Único! |
A António João Ferreira tocou ontem a fava. O terceiro toiro da tarde não tinha um passe, fugia do toureiro. O valoroso matador fez os possíveis e os impossíveis e não havia mesmo mais nada a fazer... |
Miguel Alvarenga - Com os sectores de sombra muito compostos e os de sol às moscas (pudera, com 40 graus alguém aguenta?...) realizou-se ontem na Chamusca a tradicional corrida mista de quinta-feira de Ascensão. Os cavaleiros Luis Rouxinol e Filipe Gonçalves lidaram dois toiros cada e os matadores António João Ferreira e Nuno Casquinha (em clara desvantagem) tiveram direito a enfrentar apenas só um cada. Ou seja, foi uma corrida mista assim-assim, onde existiu da parte da organização mais respeitinho pela arte equestre que pelo toureio a pé...
E depois, já estou cansado de o alertar, era preciso que as empresas repensassem tudo. Quem é que tem coragem para estar três horas à torreira do sol, com 40 graus, a ver uma tourada? Estas corridas, quer se queira, quer não se queira, têm que realizar-se à noite. E estou a falar da Chamusca. Agora imaginem o que vai ser nas corridas que estão anunciadas para o próximo mês noutras praças, sobretudo nas do Alentejo... Passa pela cabeça de alguém ir aos toiros e ficar ao sol, com este calor? A mim não me apanham mais em touradas à tarde (e estava à sombra). Praia com ele! Façam-nas à noite.
Apesar de tudo - e até do calor - a corrida foi agradável. Exceptuando o primeiro de Rouxinol e o toiro manso e fugitivo que tocou (em azar) a António João Ferreira, os toiros de Manuel Veiga tiveram nota alta e o ganadero Carlos Veiga foi premiado, merecidamente, com volta à arena no quinto. Destacaram-se o quarto, lidado por Nuno Casquinha e os quinto e sexto, lidados por Rouxinol e Filipe Gonçalves. O segundo da ordem, que coube a Filipe Gonçalves, também não complicou.
Ainda não foi desta que se viu Rouxinol não triunfar. Começa mesmo a ser impensável que isso possa acontecer. É um toureiro de nível superior e que dá sempre a cara como se fosse um principiante. O primeiro toiro da tarde era difícil e Luis Rouxinol deu-lhe a volta, sem contudo conseguir a exuberância e o brilhantismo que depois atingiu no quinto, sobretudo com o elástico cavalo Douro, com que levou o público ao rubro. Lide perfeita, Rouxinol no seu melhor.
Filipe Gonçalves lidou bem o seu primeiro toiro, bregando com acerto e cravando com emoção. No último, de excelente nota, o cavaleiro algarvio deu o seu máximo, com quiebros que entusiasmaram o público, terminando com um grande par de bandarilhas e ainda um de palmo a pedido do público. Houve entrega, profissionalismo e muira raça nas duas lides de Filipe Gonçalves.
Os toiros não complicaram a vida aos forcados do dois grupos da terra. Pelos Amadores da Chamusca foram caras Nuno Luís (que se despediu) à primeira, tendo também despido a jaqueta João Botas, que interviu como ajuda nesta primeira pega da corrida; e Luis Leitão, que concretizou à segunda, despedindo-se também das arenas.
Pelo Aposento da Chamusca pegaram João Diogo à primeira e Alexandre Mira à segunda.
A parte a pé, intercalada entre as lides dos cavaleiros e, como atrás referi, só com um toiro para cada matador, teve na faena de Nuno Casquinha os melhores momentos, já que o toiro de António João Ferreira (terceiro da ordem) não deu ao matados quaisquer opções.
António João esteve muito bem com o capote, recebendo o toiro com bonitas e cingidas verónicas, a que Casquinha respondeu com um quite por chicuelinas. No tércio de bandarilhas esteve enorme, com o poder e arte que dele fazem um dos primeiros, o valoroso João Ferreira, irmão do matador. Na faena de muleta, António João Ferreira fez os possíveis e os impossíveis, passou a vida atrás do toiro mansote e fugitivo, que não quis nada com ele, mesmo assim deixou bonitos apontamentos da arta que lhe corre nas veias e o público dedicou-lhe no final uma carinhosa ovação. Era impossível fazer mais do que ele fez.
Nuno Casquinha enfrentou em quarto lugar e depois de na arena se ter prestado homenagens às ganadarias de Noberto Pedroso e de Manuel Veiga, um toiro de nota alta e que aproveitou da melhor forma. Artista com o capote, poderoso com as bandarilhas, realizou depois uma templada e muito valorosa faena de muleta, reafirmando uma vez mais o muito valor e a imensa raça com que se está a consagrar. É um toureiro importante e o público está a reconhecer-lhe o valor.
Na direcção da corrida, com acerto e competência, esteve o antigo forcado Marco Cardoso, um dos novos "inteligentes", que dirigira já a corrida de Almeirim, tendo ontem estado assessorado pelo médico veterinário Dr. José Manuel Lourenço.
Estavam em disputa os troféus "Engº Jorge Duque" (melhor pega), "Dr. João Duque" (melhor lide a cavalo) e "Fundação Rafael e Maria Rosa Neves Duque" (melhor lide a pé), tendo os mesmos sido conquistados, respectivamente, por Nuno Luís (dos Amadores da Chamusca, primeira pega da corrida), Luis Rouxinol e Nuno Casquinha.
O júri era composto pelos consagrados forcados Carlos Empis e Nuno Megre e pelo médico veterinário Dr. Manuel Romão. E ninguém protestou, antes pelo contrário, a decisão que tomaram.
Fotos M. Alvarenga