Miguel Alvarenga - Não sendo a única,
felizmente, a empresa "Tauroleve" é, contudo, das poucas que preza e
apresenta nas suas praças aquilo que pode fundamentalmente ser a garantia de um
bom espectáculo ou, pelo menos, de um espectáculo sério - o toiro, a base
essencial da Festa Brava.
Mesmo ausente, ainda em casa a recuperar
de uma delicada operação à coluna (as melhoras, meu amigo!), o empresário
Ricardo Levesinho foi, sem dúvida, um dos triunfadores maiores da corrida de
ontem na praça de Vila Franca - onde o sucesso principal coube aos toiros de
António José da Veiga Teixeira, ganadeiro de saudosa memória, um exemplo do
lavrador à antiga, divisa agora dirigida - e bem - por seu filho António
Francisco.
Foram imponentes estampas, na maioria
dos casos cresceram ao longo da lide, investiram com alegria, trouxeram emoção
e seriedade à praça e isso foi o principal. Quando há toiros, há espectáculo,
há verdade e há emoção. A corrida de toiros era isso, noutros tempos. Antes dos
"murubes", antes dos toirinhos "telecomandados". Os
Teixeiras de ontem na "Palha Blanco" fizeram-nos reviver esse
passado. E são toiros destes, como de outras ganadarias, que podem devolver a
verdade ao espectáculo tauromáquico.
Sobre os toiros estamos conversados.
Merecidíssima a chamada à arena do ganadeiro no final da lide do quinto, o
melhor da tarde, de nome "Manique", que regressou à ganadaria depois
de, como referimos esta manhã, ter sido lidado de muleta e à porta fechada, por
solicitação do ganadeiro, pelos bandarilheiros e antigos novilheiros Manuel dos
Santos "Becas" e Fábio Machado.
A corrida de ontem teve, como se sabe,
duas alterações, mas, verdade seja dita, quase não se deu por elas. Nelson
Limas, que ia tomar a alternativa, foi substituído por Marcelo Mendes (que
lidou o melhor toiro da tarde e teve destacadíssima exibição); João Salgueiro,
que menos de 24 horas antes anunciou a inesperada e desajustada decisão de
suspender a temporada, sem se perceber bem porquê, foi substituído por Brito
Paes, que teve igualmente meritória actuação, numa temporada em que parece
disposto, outra vez, a subir os degraus que tinha descido.
Pena que o público não correspondesse,
como se impunha, ao empenho da empresa e à expectativa de se verem toiros de
verdade. Mas Vila Franca tem destes mistérios: meia casita fraca, mas muito
entusiasmo nas bancadas e, sobretudo, muito aficionado de solera e alguns
toureiros entre o público.
O destaque da tarde, entre os seis
cavaleiros, foi ontem, indiscutivelmente, de Marcelo Mendes. Lidou o melhor toiro da corrida (o
quinto, que "nunca é mau", como reza, às vezes, a tradição), sim
senhor, mas protagonizou também, verdade seja dita, a melhor actuação que lhe
vimos nos últimos tempos. Houve arte, valor, raça e toureirismo em todos os
detalhes. Terminou em grande com os adornos únicos do cavalo "Único",
mas antes já dissera que estava ontem ali para marcar a diferença - e marcou-a,
de facto. Foi uma lide em crescendo, com o cavaleiro a arriscar e a pôr a carne
toda no assador, desenhando sortes frontais de grande emoção e cravando com
verdade "en su sítio", rematando todas as sortes com inspirada veia
artística. Melhor era impossível. Grande Marcelo!
Em Dia da Mãe, abriu praça a valente
Sónia Matias, com um emotivo brinde a sua Mãe, vítima de graves problemas de
saúde, mas a recuperar felizmente e que assistiu em cadeira de rodas à corrida.
Dedicou-lhe Sónia uma actuação plena de ousadia, de verdade toureira e de
grandes ferros em sortes de arrepiar. Impôs seriedade à lide e triunfou.
Ana Batista rubricou de seguida, também,
uma excelente actuação frente ao segundo toiro da tarde. Esteve correcta na
preparação das sortes, séria na cravagem e alegre nos remates. Com um toiro que
pedia contas, veio acima a garra da cavaleira de Salvaterra, sempre um portento
de classe. Muito bem.
António Maria Brito Paes procura
reafirmar-se e reocupar o posto que já foi seu. Está novamente bem montado e
moralizado. Rubricou uma lide limpa e sem falhas, que chegou ao público,
sobretudo quando montando o cavalo com o ferro de Pablo Hermoso.
Paulo Jorge Santos é um cavaleiro de
valor e mostra sempre que o é. Merece maior atenção por parte das empresas -
repito, como já o disse aquando do seu recente triunfo em Salvaterra. Ontem
teve pela frente o toiro mais complicado da corrida. Insistiu nos "câmbios"
e as coisas nem sempre resultaram. Teve altos e baixos a sua lide. No final,
recusou a volta à arena. Esteve toureiro.
Depois do triunfo de Marcelo Mendes, foi
o amador colombiano Jacobo Botero quem fechou a corrida. Decidido e com as ganas
de sempre, esperou sózinho o toiro no centro da arena e cravou um comprido de
grande impacto e justificada emoção. Desenvolveu depois animada lide, pecando
apenas por sucessivos toques sofridos no momento do ferro.
Os toiros de Veiga Teixeira impunham
respeito e seriedade e tiveram pela frente grandes forcados, pese embora o
facto de terem ido quase sempre "pelo seu caminho", com a força de um
comboio, mas sem dificultar em demasia. Houve rijas pegas e houve, sobretudo,
momentos de grande emoção protagonizados pelos valentes rapazes das jaquetas de
ramagens dos grupos de Vila Franca e de Coruche.
Pelos vilafranquenses pegaram, todos à
primeira e com o grupo a ajudar muitíssimo bem, Pedro Castelo, Bruno Casquinha
(com excelente e oportuna ajuda de Tiago Oliveira, chamado no final à arena) e
Márcio Francisco.
Pelo grupo coruchense, foram caras José
Marques e José Sousa, ao primeiro intento; e Ricardo Dias à segunda, após
sofrer violento derrote na primeira tentativa. Também aqui, destaque para as
valorosas intervenções de todos os elementos em praça.
Excelente actuação de todos os
bandarilheiros que integraram as quadrilhas de ontem e, como sempre, uma
correcta direcção de Rogério Jóia, sobre o qual recairam no final do
espectáculo algumas críticas - desajustadas, a meu ver - sobre os
"timing's" da concessão de música aos cavaleiros. Jóia foi o homem
certo no lugar certo e a banda do Ateneu Artístico Vilafranquense, na minha
oponião, tocou no momento em que merecia ser ouvida. Mais nada.
Já a seguir: todas as fotos de ontem em Vila Franca!
Fotos M. Alvarenga e Ana de Alvarenga